Coluna: Os riscos do contrato de gaveta na aquisição de um imóvel. Por Cristiano Meneghetti

Você já deve ter ouvido falar na frase “quem não registra não é dono”, quando o assunto é imóvel, correto? Caso não, é importante ter conhecimentos básicos quando o assunto é compra e venda de um bem tão importante na vida das pessoas para evitar ou mitigar problemas futuros.

Segundo o Ministério de Desenvolvimento Regional, calcula-se que de 60 milhões de domicílios urbanos do país, 30 milhões não possuem escritura. São diversos fatores que levam a irregularidade de imóveis no Brasil, o que já se tornou um problema histórico proveniente de invasão, loteamentos sem observância à legislação, terrenos e imóveis vendidos de forma ilegal, além de construções sem projeto aprovado pela prefeitura municipal.

Diante desse cenário, muitas pessoas acabam adquirindo a tão sonhada casa própria por meio do “contrato de gaveta”, que nada mais é que um contrato feito entre particulares, mas que não é levado à registro na matrícula do imóvel perante o Cartório de Registro de Imóveis (CRI). Como consequência, não haverá a transferência imediata da propriedade para o nome do novo proprietário (comprador).

Comumente esse tipo de negociação é realizada para imóveis que estão financiados. Tomemos como exemplo João, que adquiriu um imóvel perante o Banco Juros Altos, porém, não conseguindo arcar com as parcelas, resolve vender seu imóvel para um terceiro, sem, contudo, formalizar a transferência do financiamento perante o Banco e o Cartório de Imóveis. João se utiliza tão somente do “contrato de gaveta”. Assim o comprador “assume” as parcelas do financiamento até a quitação do bem.

O problema desse tipo de negociação é que o vendedor continua com a propriedade do imóvel, ou seja, quem adquiriu é um mero “possuidor” do bem, não podendo gozar de toda a proteção jurídica que a lei oferece ao legítimo proprietário. Dizemos que o contrato só vale entre as partes, pois não há publicidade do ato jurídico, que só ocorre com o registro da transferência da propriedade perante o CRI.

Um dos principais motivos para a realização do “contrato de gaveta” são as altas taxas cartorárias, conhecidas como “emolumentos”, que incidem sobre a lavratura da escritura e no registro. Ainda, deve ser pago o ITBI (imposto de transmissão de bens imóveis), que no Amazonas é de 2% sobre o valor do imóvel. Além dos custos, outro motivo são as irregularidades, que podem ir desde ausência de matrícula até dívidas de IPTU, o que impede a transferência da propriedade.

Dentre os principais riscos envolvendo esse tipo de negócio podemos citar o falecimento do vendedor. Assim, esse imóvel irá para inventário dos bens do proprietário em cujo nome estiver registrado no cartório de registro de imóveis, ou seja, quem pagou anos a fio de maneira “informal” de “gaveta” não terá direito ao imóvel, pois não é herdeiro.

Outro risco é o vendedor contrair uma dívida e não pagar, podendo ocorrer a penhora arresto, sequestro e até ir à leilão por decisão judicial. Ainda, o vendedor poderá vendê-Io novamente a outra pessoa ou oferecer em garantia por uma dívida dele sem o seu conhecimento.

O vendedor também está sujeito a riscos, como a inadimplência do comprador em relação as parcelas “assumidas”, pois poderá ter seu nome negativado, levado à protesto ou executado pelo banco, pois é seu nome que consta como proprietário no registro de imóveis.

Mas afinal, o contrato de gaveta é permitido pela jurisprudência? Sim. Os tribunais têm reconhecido a validade do contrato de gaveta entre os contratantes.

Para quem não tem condições de realizar a transferência da titularidade imediatamente, recomenda-se que faça a averbação da escritura pública de compra e venda do imóvel na matrícula do imóvel objeto da negociação, para que, pelo menos, assim terceiros interessados no imóvel possam ficar cientes da negociação envolvendo comprador e vendedor, o que diminui as chances de perder o imóvel.

Por fim, caso não seja possível comprar o imóvel pelos trâmites formais, seja por questões financeiras, seja por necessidade de regularização, é possível sim se valer do desse contrato, devidamente elaborado por um advogado especialista na área, com firma reconhecida por ambas as partes. Também é importante o comprador guardar toda documentação em relação à negociação, desde comprovantes de pagamento, e-mails e fotos do imóvel, caso seja necessário comprovar, perante terceiros, que a aquisição se deu de boa-fé.

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